Carta aberta em defesa da Internet no Brasil
[Lida na sessão de encerramento do IGF 2018]
Por ocasião do Fórum de Governança da Internet de 2018, ocorrido nos dias 12 a 14 de novembro em Paris, a Coalizão Direitos na Rede vem manifestar sua posição em relação aos riscos que correm as políticas de Internet no Brasil com a perspectiva do governo Bolsonaro. O Brasil conquistou importantes avanços nos últimos anos nos campos da liberdade de expressão, acesso à informação e no gerenciamento democrático das comunicações através da governança multissetorial da Internet que devem ser assegurados frente as ameaças eminentes que estão por vir. O Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), a Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/2018) e as políticas de expansão do acesso e da conectividade são referências dessas conquistas.
Elas garantiram ao Brasil uma posição de destaque e reconhecimento internacional no que diz respeito à cooperação entre setor público, empresarial, acadêmico e sociedade civil para a governança multissetorial, que vem sendo determinante para o desenvolvimento da Internet no país, equilibrando as demandas de diferentes grupos da sociedade.
O Marco Civil da Internet foi fruto dessa cooperação multissetorial, e estabeleceu princípios, garantias, direitos e deveres celebrados internacionalmente, sendo hoje referência para o mundo.
Outro esforço que também envolveu uma articulação positiva entre estes diversos setores foi a aprovação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais em sintonia com a GDPR europeia de modo a garantir políticas de privacidade e acesso, conferindo segurança jurídica para o desenvolvimento econômico e de novas tecnologias. A lei também oferece as condições necessárias para a construção de políticas públicas baseadas no tratamento de dados por parte do Estado de modo a evitar a vigilância massiva e arbitrária do poder público perante os cidadãos e cidadãs. Nesse sentido, é reprovável o fato de que uma Autoridade Nacional de Proteção de Dados Pessoais, cujo papel é fundamental para a efetividade da nova lei, foi vetada pelo atual Presidente da República. Ademais, há o risco anunciado pelo governo eleito, de que a regulação e fiscalização da exploração de dados pessoais no Brasil serão submetidas a organismo de caráter militar como a Agência Brasileira de Inteligência, o que compromete as liberdades democráticas.
O momento atual também requer atenção especial à garantia da segurança das comunicações e das liberdades individuais e coletivas com a participação democrática dos diversos setores a fim de viabilizar seu controle social. A privacidade é central para isso e medidas concretas devem ser adotadas visando a proteção dos dados armazenados nos âmbitos público e privado pela adoção e promoção de tecnologias seguras e da defesa da criptografia.
É imprescindível, por fim, fortalecer as instituições que trabalharam com essas políticas, garantindo os avanços citados acima e a construção democrática das políticas de Internet, especialmente o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), a Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP) e universidades e centros de pesquisa de caráter público que contribuem no desenvolvimento e soberania da infraestrutura e da Internet no Brasil.
Nesse sentido, a Coalizão Direitos na rede denuncia a gravidade das práticas adotadas em propagandas eleitorais que envolvem as plataformas de Internet que dominam o mercado de redes sociais. O WhatsApp, por exemplo, serviu a interesses políticos que influenciaram o cenário das eleições com sérias violações a Lei Eleitoral.
Por todas essas razões as entidades membras da Coalizão Direitos na Rede procuram com essa carta mobilizar a solidariedade internacional em torno da defesa dos direitos digitais no Brasil. Não há espaço na governança da Internet para medidas antidemocráticas.
Internet Governance Forum 2018
Coalizão Direitos na Rede — Brasil
Versões em português e inglês disponíveis em https://rets.org.br/?q=node/3357